Pedaços Humanos

sábado, 1 de maio de 2010

Prefiro Nada

'Isso não é uma carta de amor.
É a carta de quem nunca tentou.
De quem tem o que merece: a infelicidade
pedida à la carte, por livre e espontânea vontade.
De quem se alimenta de pequenas sensações voláteis.
Uma vida miserável que sente prazer na caça.
O vazio me move.

Assumo que não quis enxergar o quanto você era diferente.
Sabia, lá no fundo, que pessoas como você são raridade.
Mas deixei lá no fundo mesmo. Junto com minha coragem.
Preferi isso que tenho agora. Efemeridade, sentimentos ralos,
uma vida levada na superfície. Troquei você por sexo mais ou menos com um aqui outro ali, por aquele calor no peito que precede o primeiro beijo com alguém novo. Escolhi continuar procurando. Me dá mais prazer.

Nunca vai ser igual. Ninguém tem esse gosto, ninguém tem esse cheiro bem ali atrás da orelha, esse jeitinho de terminar um beijo.
Ninguém tem esse olhar que me frita, que me faz pensar em sexo quando estou cortando cebola. Ninguém tem essa voz que faz minhas cabeça pirar automaticamente, ninguém arranca esses gritos, esses pedidos falsos para parar. Sou dobradiça frouxa com você.
Mas não posso trocar o mundo do maravilhoso desconhecido por nós.
Aliás, mal consigo falar nós. Preciso da adrenalina que alimenta os pobres de espírito.

Não é o momento. Já ouvi isso antes. Você é ótima, mas não estou pronto pra isso agora. Chegou minha vez de ser o idiota.
Abro mão de você, de todas as risadas que arranca de mim, de todas as possibilidades de um futuro feliz, pela busca.
Assumo o risco de me arrepender profundamente.
De um dia bater à sua porta e dar de cara com seu esposo perfeito, carregando um bebê-propaganda, em uma casa tinindo de limpa, cheirando a uma felicidade insuportável e inabalável. Diria que errei de número e perguntaria onde tem um bar.
Passaria o dia bebendo sozinho, esperando que você passasse só pra ter o prazer de me ver
conformado com a vida besta que escolhi e repetir baixinho que sabia que isso aconteceria.
Você mereceria se esbaldar com minha desgraça.

Sou um imbecil, eu sei. Não estou preparado para tanto amor, para uma vida adulta. Você é demais. Certamente me faria crescer, arrumar um emprego melhor, vestir algo passado, comprar meias novas, freqüentar lugares onde os garçons são simpáticos.
Preciso de alguém pra quem possa apresentar Lynch, Sandman, Radiohead. Alguém mais cru. Alguém menos ameaçador à minha auto-estima.

Você me faz querer ser melhor. E eu não posso conviver com essa pressão.'



(Retirado do blog : redatoras de merda)

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