Pedaços Humanos

domingo, 30 de maio de 2010

Gente grande

'Ele tinha medo de virar gente grande. Não admirava gente grande. Eles não choravam na frente dos outros, mesmo que o coração apertasse muito. Não se divertiam com gargalhadas sempre que a graça assim o pedisse. Não admitiam o desejo pelo último pedaço. Não podiam brincar. Não banhavam na chuva, nem deixavam gente pequena banhar. Podem ficar doentes, eles diziam. Mas tristeza também adoece, ele pensava. Ele não compreendia porque ser feliz era um pecado para os grandes. Gente grande precisava alcançar o sucesso. Lê-se: fazer qualquer coisa de que não goste, em todo o tempo que não tem, para ganhar dinheiro, muito dinheiro e mais dinheiro. Para não gastar com bobagens, vale ressaltar, no tempo que não sobrava. Gente grande não tinha tempo para bobagens. Bobagens? Pois sim. Foi até no dicionário e descobriu: bobagem é sinônimo de criancice. Certamente um adulto inventou isso! Assim, pensou: se criança vive criancice (!) ele era todo bobagem. E não interessava virar alguém indiferente a ele mesmo. Mas a vida prega peças e, sim, ele cresceu. Ficou magoado, chorou, quando no espelho, viu uma gente grande que gosta de criancices. Hoje ele se pergunta como é possível ser gente grande e continuar gostando de ser feliz. Enquanto procura a resposta, ele vai fazendo algumas bobagens. Lê-se: ele vai sendo feliz.'


(blog 'e agora maria?')

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