Pedaços Humanos

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Cajueiro

'Meu velho, foi um ano difícil. Difícil de saudade. Lembro ainda com a exatidão do momento, nosso último abraço e o cheiro da tua cabeça branca. Ah, meu velho, foi neste ano inteiro o cheiro que mais desejei sentir. Ainda te vejo entrando no quintal ou chegando da feira com a cesta cheia de milho, pirulitos e amor, tudo de graça. Lembro da tua alegria com as frutas que nasciam no teu quintal e teu sorriso sorrateiro, de quem, teimoso, usava o açúcar escondido. Das suas discussões sem fim com ela, que tinham virado gracejo já no fim. A gente dizia e foi provado, era só amor que ela tinha por ti. Fizeste falta. Todos os dias. Levaste a parte de nós que nos unia. Talvez não soubesses, era o nosso único elo. O que temos em comum acordo hoje é tua saudade, nada mais. A tua e a dela, que partiu um pouco depois para aliviar o que nenhum remédio faz ainda pela dor da ausência. Teu nome continua trazendo risos aos nossos lábios, mas agora acompanha sempre olhos lacrimosos. Tenho vivido o amor em silêncio, como disse que o faria. Estou cumprindo minha promessa ao amor que tantas vezes me abraçou. É verdade, e o senhor sabia, onde há ato, não se precisa de palavra. Espero que eles um dia compreendam tua lição, e substituam mágoas por gratidão, por respeito ao amor que sempre nos deste, a despeito de qualquer diferença. Queria hoje sentar na calçada contigo, escutar teus casos, te ver sorrir. Queria pedir a tua benção, pegar na tua mão, sentir os teus dedos, ouvir tua voz, ‘vá com Deus, fia’. Teu amor é o que está presente nas melhores lembranças. Na gratidão eterna por ser teu sangue e na certeza de tê-lo amado muito e, milagrosamente, ser plenamente correspondida. Faz um ano, nosso abraço está guardado. Sinto, meu velho, não tarda muito o dia de entregar-te.'


(blog'euamaria')

Nenhum comentário:

Postar um comentário