Pedaços Humanos

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Ela também se foi

'Os dias se passaram, mas não havia o menor sinal de superação. Aliás, havia uma nova teoria. Essa história de que o tempo diminui era mentira, o tempo só aumenta. E ela disse desde aquele dia que não suportaria. Entre um misto de sentimento, dor, remorso e saudade ninguém saberia dizer o que exatamente era. Mas sabia-se que ela estava falando no auge da emoção, e por mais que a dor fosse visível, devia ser só isso.


Não era.

54 dias de saudade aumentando e consumindo, ela partiu. Ela descansou da dor indizível, incalculável e insuportável. O coração que era dele clamou por ele, a dor foi maior e ela foi. ‘Mas era só emoção, só dor... Não era verdade quando ela dizia’. Sim, era verdade sim. E se não acreditamos fomos mais surpreendidos do que o normal. Eu que não tinha voltado lá ainda para não ver o lugar, as lembranças, voltei e vi exatamente a mesma cena. Ela repousando exatamente no mesmo lugar que ele, da mesma forma que ele. Mesma casa, mesma cena. Reprise. Eles que tinham uma imagem conjugada, uniram o luto. Respirei fundo e vesti a mesma roupa, a mesma dor, o mesmo luto e a mesma resignação. Recebi os mesmos abraços, as mesmas palavras, o mesmo silêncio. Mas as lágrimas não, as lágrimas tornaram-se inumeráveis, irrefreáveis.

Meus olhos só viam a dor que havia levado àquela cena. Só viam as noites solitárias de dor que ela passou, e a culpa que até ela havia colocado sobre si. A solidão de quem perdeu seu motivo, sua rotina, sua vida. Na verdade, havia 54 dias que ela também tinha nos deixado. Mas devo dizer que nunca é tarde. Se foram anos de distância, em poucos dias ela apresentou a alma despida, sensível, entregue e desarmada. Foi o suficiente para levar todas as lágrimas, nos fazer entender décadas e lamentar o peso da solidão que ela carregou por poucos longos dias. Então a deixamos do lado dele, onde ela sempre esteve, onde ela sempre teve de estar. Onde ela sabia que precisava estar. Precisava. Quem precisa não sabe viver sem. Aceitamos. Não há outra opção, mas creio que mesmo que houvesse, aceitaríamos. Seria egoísmo pedir que aquela ligação fosse interrompida. E carregamos aquela dor que é de todos, mas é de cada um. Com ela, a resignação, esta que nos faz aceitar a busca pelas respostas, já que as próprias não teremos.'


( blog 'euamaria')

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